Golpes financeiros contra pessoas idosas

Portal do Envelhecimentojun 23Os 3 principais golpes financeiros aplicados a pessoas idosas são: clonagem de cartão, solicitação de dinheiro via WhatsApp, e central falsa de atendimento.

Por Leticia Martins Bitar de Moraes e Maria das Graças Bendelack Santos (*)

De acordo com dados divulgados pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, nos primeiros três meses de 2023, as violações de direitos humanos contra pessoas idosas alcançaram 202,3 mil registros em todo o país, cabendo enfatizar que o número é 97% maior se comparado com o mesmo período de 2022, quando foram registradas 102,8 mil violações. Segundo o secretário nacional dos direitos da pessoa idosa, Alexandre Silva, “O etarismo se mostra mais cruel do que nunca”.

Ainda em 2022, conforme dados divulgados pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH), as pessoas idosas figuravam como as maiores vítimas das violações aos direitos humanos, e no período de janeiro a primeira semana de julho de 2022, quando foram registradas mais 44 mil denúncias, 12 mil eram relacionadas à violência patrimonial ou financeira dirigidas a pessoas com 60 anos ou mais (54,8%), seguido de mulheres (28,2%) e crianças e adolescentes (6,7%).

Nesse sentido, o dado marcante dessas violações, especialmente no que se refere à violência patrimonial ou financeira, é que houve um aumento de 60% nas tentativas de golpes financeiros contra as pessoas idosas em razão do uso mais intenso dos meios digitais durante a pandemia, segundo informou a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), deixando bem evidente a preferência dos criminosos pelos referidos meios, até porque permitem menor exposição, maiores facilidades para o cometimento de crimes e criam maiores dificuldades à descoberta de seus autores.

Cabe salientar que o art. 102 do Estatuto da Pessoa Idosa prevê a referida violência no ato de apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento da pessoa idosa, dando-lhes aplicação diversa da de sua finalidade, punindo com pena de reclusão de um a quatro anos, além de multa para quem cometer tal delito.

É inquestionável que a sociedade atual é fortemente marcada pelos avanços, sem precedentes, advindos das inovações tecnológicas, que ocorrem em velocidade exponencial, trazendo imensos benefícios à vida humana, permitindo soluções para os mais variados problemas, inclusive em situações de pandemia, estreitando fronteiras e laços, aproximando as pessoas, abrindo espaços à convivência em ambiente não presencial ou virtual para os mais variados fins, sejam eles educacionais, sociais ou financeiros.

No entanto, essa mudança contínua e veloz em razão das inovações tecnológicas, que deixa à mostra uma modificação dramática na relação espaço e tempo das pessoas, também deixa evidente que envelhecer de forma saudável requer que tais inovações sejam não só inclusivas, mas reativas aos golpes praticados, sobretudo pelos delinquentes digitais.

Com efeito, aliado ao fato de ter se tornado um grande atrativo aos delinquentes, o meio ambiente virtual, que se tornou campo fértil à implementação de contínuas inovações tecnológicas, traz consigo o efeito reverso dessas inovações, que são novos instrumentos nas mãos de criminosos para a prática de ilícitos na medida em que cresce a informatização das atividades exercidas pelas pessoas (físicas e jurídicas), além do aumento do tempo que passam respirando ares virtuais, situações cujo alcance e efeitos ainda não foram corretamente avaliados ou mensurados, até mesmo em razão da velocidade daquelas inovações.

A hipervulnerabilidade das pessoas idosas

De antemão, todas as pessoas que navegam na internet, nas redes, por meio de celulares, computadores e outras tecnologias, no intuito de construir relações, trabalhar, adquirir e aprimorar conhecimentos, ou realizar transações financeiras, estão expostas a ilícitos civis e penais, ou seja, são vítimas em potencial de tais ilícitos, carregam consigo uma vulnerabilidade inerente tão só pelo fato de navegarem no meio ambiente virtual.

Com efeito, é preciso que as inovações tecnológicas estejam voltadas em sua grande parte às pessoas idosas, ou que tais avanços ou benefícios não desconsiderem tal parcela fundamental da sociedade, de modo a compensar ou mitigar sua vulnerabilidade, sem deixar de ressaltar que existe um conjunto de normas protetivas, a Lei nº 10.741/2003 (Estatuto da Pessoa Idosa), que impõe ao poder público a criação de oportunidades de acesso à educação, sobretudo por meio de cursos especiais que deverão incluir conteúdo relativo às técnicas de comunicação, computação e demais avanços tecnológicos, para sua integração à vida moderna, como previsto no art. 21, §1º, daquele estatuto.

A educação é não só via inclusiva à pessoa idosa ao mundo digital, como também uma via reativa a golpes digitais, uma vez que possibilita a aquisição de competência ou capacidade de defesa contra os delinquentes da vida moderna.Vale dizer que a própria necessidade de um conjunto de normas protetivas, capitaneado pelo Estatuto da Pessoa Idosa, que possui, inclusive, um capítulo dedicado aos crimes praticados contra referida parcela da sociedade, evidencia não só a existência de uma vulnerabilidade, mas de uma vulnerabilidade que poderá ser acentuada, agravada ou exacerbada em razão de diversos fatores ou condições, sejam eles biológicos, relacionados à idade, à integridade física ou psíquica; sociais, culturais, educacionais, técnicos ou econômicos, em face da condição financeira ou da formação educacional; fatores relacionados ao ambiente de consumo, ou seja, uma hipervulnerabilidade que precisará ser cuidada ou mitigada em prol da preservação do princípio da dignidade da pessoa humana e da igualdade, o que é obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do poder público.

Nesse sentido, é certo que a definição de hipervulnerabilidade fica bem evidente quando se conjuga a condição de pessoa idosa e a condição de consumidor, situação resultante de um diálogo entre as normas protetivas contidas no Estatuto da Pessoa Idosa e no Código de Defesa do Consumidor, partindo-se da presunção absoluta de que basta à pessoa idosa atuar no meio ambiente de consumo para ser considerada como parte hipervulnerável.

No entanto, a mesma situação se repete quando a pessoa idosa atua ou se aventura pelos caminhos digitais, ou seja, tão só o fato de respirar os ares do meio ambiente virtual já é razão para se considerar que há uma presunção absoluta, uma certeza da hipervulnerabilidade, até porque as normas protetivas e regulatórias sobre a utilização da internet, das redes ou seus mais variados caminhos e recursos ainda são insuficientes para coibir golpes, somando-se a isso o fato de que até para uma pessoa que não faça parte do grupo etário em referência já há uma vulnerabilidade inerente, como fora dito.

Golpes financeiros mais recorrentes

O Radar Febraban 2023 registra o percentual de 31% de brasileiros que relatam ter sido vítimas de golpes ou tentativas de golpes. Em que pese a estabilidade no número declarado de vítimas, as menções aos três principais golpes aplicados aumentaram em relação aos resultados de fevereiro de 2023.

Com efeito, o golpe da clonagem ou troca de cartões continua sendo o mais comum (50%), com oscilação de mais 2 pontos; a situação em que alguém se faz passar por um conhecido solicitando dinheiro pelo WhatsApp é relatada por 28% dos entrevistados; e empatado em segundo lugar (28%) aparece o golpe da central falsa em que uma pessoa pede seus dados por telefone. Essa menção também oscilou mais 2 pontos em relação ao RADAR de fevereiro de 2023.

O golpe da clonagem de cartões

É um golpe no qual o criminoso consegue ter acesso às informações do cartão da vítima, como nome, número, data de vencimento e código de segurança, o famoso número de três dígitos, e de posse desses dados em mãos, é possível clonar o cartão e fazer compras online, uma das modalidades de aplicar o golpe. O que preocupa por ser um golpe fácil e rápido, e basta que um cartão não tenha chip para que um leitor adulterado, seja copiada a trilha magnética que existe atrás dele.

Há uma série de medidas preventivas para evitar essa modalidade de golpe, tais como:

- compras online somente em endereços que sejam realmente confiáveis;

- não fornecer a senha, desconfie, pois não é necessário informá-la em nenhuma etapa da operação;

- nunca fornecer os dados do seu cartão de crédito para ninguém, muito menos pelo WhatsApp, ainda que sejam pessoas conhecidas. Isso porque os dispositivos dessas pessoas também podem ser acessados por golpistas;

- não deixar que atendentes de estabelecimentos físicos ou que qualquer pessoa leve o seu cartão longe do seu campo de visão, uma vez que poderá ser fotografado, para que sejam copiados seus dados;

- prefira senhas seguras e forte, evitando usar o seu nome, data de nascimento e número de telefone, e sempre procure misturar letras maiúsculas e minúsculas, além de caracteres especiais;

- procure criar uma senha para cada acesso;

- monitore de perto a sua fatura, que se consegue pelos aplicativos de banco, para que qualquer compra suspeita seja rapidamente identificada;

- preocupação comum aos golpes financeiros é sempre tomar cuidado com links recebidos por SMS ou via e-mail, e evite acessar mensagens de destinatários desconhecidos.

O golpe do WhatsApp

Ocorre quando são descobertos o número do celular e o nome da pessoa, para que os golpistas possam cadastrar o WhatsApp, concluindo a operação quando é confirmado o código de segurança pela vítima, que já havia sido encaminhado via SMS, mediante a falsa afirmação de que se trata de uma atualização, manutenção ou confirmação de cadastro. De posse do código, o WhatsApp é replicado em outro celular, para que os delinquentes enviem mensagens aos contatos da pessoa, fazendo-se passar por ela, pedindo dinheiro emprestado.

Golpe da central falsa de atendimento

Ocorre quando golpistas ligam para o celular da vítima fingindo ser da central de atendimento de alguma empresa ou instituição e induzem a transferência de dinheiro ou fornecimento de informações pessoais pela vítima.

Se ligarem pedindo para confirmar dados como senhas e número de cartão, para instalar aplicativo, ou para depositar dinheiro na conta de outra pessoa, desligar imediatamente o telefone, o mesmo se aplica às ligações para atualização do aplicativo, até porque ela é automática, e a regra de ouro é ter a certeza de que os bancos nunca ligam para tal finalidade. Portanto, encerrar a ligação e buscar contato com a central de atendimento da empresa por meio dos canais oficiais.

Golpe do falso funcionário do banco

O golpista engana as vítimas se passando por um falso funcionário do banco ou empresa que mantém vínculo ativo com o cliente, utilizando-se de informações falsas sobre irregularidades na conta ou que dados cadastrais estão incorretos, apropriando-se de dados pessoais e financeiros, para fazer transações fraudulentas em nome do cliente.

Os bancos nunca ligam para o cliente para pedir senhas, números de cartão ou para realizar transações ou pagamentos, e se isto ocorrer deve utilizar o número registrado no cartão e ligar de outro número.

Phishing

O phishing é uma modalidade de fraude eletrônica cometida pelos golpistas para obter dados pessoais, por meio de mensagens, e-mails falsos ou páginas falsas na internet, induzindo a vítima a clicar em links suspeitos, inclusive de bancos. As orientações são basicamente as mesmas, as vítimas devem se certificar se o endereço da página de internet é confiável, sempre dando preferência aos sites conhecidos, nunca clicar em links suspeitos ou anexos de e-mails, verificar se são remetentes novos, se a ortografia ou gramática é ruim e sempre desconfiar de saudações genéricas.

Golpe do falso motoboy

É o golpe que se inicia com uma ligação ao cliente de uma pessoa que se passa por funcionário do banco, e diz que o cartão foi clonado, informa que é preciso bloqueá-lo, cortá-lo ao meio e informar a senha àquele funcionário, que mandará um motoboy buscá-lo para perícia, no entanto, a intenção é se apropriar do chip para realizar diversas transações. Os bancos não pedem cartão de volta, nem mandam pessoas buscarem cartão na casa do cliente. Na dúvida, fale com seu gerente.

Golpe do falso leilão

O golpista simula um falso leilão fornecendo um link para que a vítima cadastre seus dados pessoais e financeiros, ou para que deposite um valor na conta do estelionatário. O cliente nunca deve enviar dados, senhas e acessos a ninguém. Na dúvida, verificar a origem dos links recebidos antes de clicá-los.

Golpe do extravio do cartão

Os golpistas furtam a correspondência contendo o cartão no caminho de seu destinatário, logo depois ligam para a vítima se passando por um funcionário do banco com a falsa informação de que houve problemas na entrega do cartão, e que para solucionar o suposto problema, é solicitada a senha, e com a descoberta dos dados fazem transações em nome da vítima. A vítima nunca deve enviar dados, senhas e acessos a ninguém, tampouco, preencher formulários na internet com dados pessoais e financeiros sem verificar a origem. Caso o prazo de entrega do cartão se esgote, é preciso informar o gerente sobre o atraso. Na dúvida, converse com o banco pelos canais seguros.

Golpe do Delivery

É o golpe da maquininha, o cliente faz o seu pedido via aplicativo, mas o entregador apresenta o equipamento com o visor danificado ou o que impossibilite a visualização do preço na tela, para lançar um valor cobrado acima do real, no entanto, só após algum tempo, a vítima percebe que realizou um pagamento acima do devido. É fundamental pegar a maquininha para checar o preço cobrado em seu visor, nunca aceitar maquininhas onde os valores que são cobrados não estejam visíveis. Dê preferência em fazer o pagamento via aplicativo e não no momento da entrega, ainda assim se cercando de cuidados com os dados.

Considerações finais

As pessoas idosas são as grandes vítimas dos golpes patrimoniais ou financeiros praticados na modernidade, em razão da sua vulnerabilidade agravada ou potencializada, não só quando atuam no meio ambiente de consumo, talvez o mais comum, ou quando navegam no meio ambiente virtual, que se mescla muitas vezes às práticas de consumo, lugar onde se evidencia largamente a hipervulnerabilidade daquela parcela fundamental da sociedade, sobretudo como potenciais vítimas de delinquentes virtuais.

Os golpes são os mais variados possíveis, e as inovações tecnológicas quase sempre são acompanhadas pelos que fazem o movimento reverso, no sentido do cometimento de ilícitos virtuais se aproveitando dos benefícios e das fragilidades daquelas inovações.

Nesse sentido, é preciso que a pessoa idosa receba educação voltada à vida virtual, sobretudo como medida inclusiva e reativa aos golpes perpetrados pelos criminosos da modernidade, especialmente mediante a aquisição de competência para prevenir golpes patrimoniais ou financeiros, e o funcionamento efetivo de uma rede de proteção que privilegie a educação para a vida no meio ambiente virtual.

Referências
BRASIL. Estatuto da Pessoa Idosa. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Diário Oficial da União, Brasília, DF, n. 192, 3 outubro de 2003.(*) Leticia Martins Bitar de Moraes - Advogada, Mestre em Psicologia/UFPA, Conselheira da OAB/PA, Presidente da Comissão da Pessoa Idosa da OAB/PA, Membro da Comissão Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa da OAB, Presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Idosa – CEDPI, Mediadora e Conciliadora-TJPA. E-mail: leticiabitar@hotmail.comMaria das Graças Bendelack Santos (Graça Bendelack) - Mestre em Direito das Relações Sociais - Universidade da Amazônia, Advogada, Conselheira da OAB/PÁ, Presidente da Comissão Especial para Inclusão de Conteúdos Voltados ao Processo de Envelhecimento, ao Respeito e à Valorização do Idoso da OAB/PÁ, Professora da Escola Superior da Advocacia - ESA. E-mail g.bendelack@hotmail.com.

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